7 de agosto de 2014

"Vó rendeira"


Acrílica s/ tela, 40 x 60 cm
Acervo particular

"Na Bodega de Zé de Deus" - Prêmio Chico Santeiro 2014


Acrílica s/ tela, 80 x 100 cm  

Acervo da Pinacoteca do Estado do RN


Texto de Assis Costa


Esse trabalho, como tantos outras obras que pintei, busca colocar-nos diante e dentro e um espaço íntimo imaginário, onde elementos icônicos de "nossa cultura" povoam momentos congelados no calor da criação pictórica. O artista tem ir aonde o povo está, mas se o artista é o povo, onde este está, está toda a representação desse pensamento.
Quando escolho a Bodega para representar esse espaço, de fato, insiro toda uma constituição de sentimentos e ideias, que nos remete instantaneamente para os tempos de infância. Eu mesmo desde tenra idade já atendia os pedidos de minha mãe para ir até a bodega comprar pão ou outras coisas básicas da casa; ali para mim estava representado o lugar que supria as necessidades, atendia os nossos desejos, lugar onde as pessoas se encontravam para conversar e se divertir. "tomar umas e outras". Esse é o espaço impregnado de sentidos; quando se fala em bodega há de se pensar no cheiro, nos gosto, nos ruídos e nas cores de tudo que emana daquele microcosmo, que vem muito antes dos shopping centers. Nesse trabalho, a ideia básica nasce da tradicional representação das santas ceias, mas deixei que a mensagem ficasse em segundo plano, de maneira mais subliminar, para mostrar que a comunhão das artes se dá de forma muito mais espontânea, é a vontade de saciar uma necessidade básica, a do espírito criador que está no artista. O pão está ali representado, mas a busca é por outro alimento; se embriagam muito mais pela alegria de fazer cantar a alma, do que por beber o vinho.
O velho Sanfoneiro cego de um olho é rei nessa terra, e até mesmo o cego Aderaldo se sente feliz por ouvir e cantar junto com seu rei. E o Cristo está ali pendurado, não na cruz, mas numa gravura na parede abençoando o grupo, falando aos missionários da arte que o seu coração está aberto e entregue, para guiar-nos nessa difícil jornada que é a vida.
Quem são eles afinal? São pessoas comuns, na maioria das vezes trabalhadores braçais, e isso é fácil de perceber através de suas feições, pois aqui vemos vaqueiros e agricultores que fazem do ofício da sua arte um alento para as lutas e as dores do cotidiano. Aqui se comemoram coisas simples; mais um dia vencido, o que se colheu a custa de empenho após um inverno fraco, o fato de estarem juntos. Esse é um espaço democrático, onde os animais domésticos também se irmanam nesse fantástico mundo literário cordelístico, e não à toa o cordel que o jovem ler é a obra do poeta potiguar Antônio Francisco: Os animais tem Razão. Enfim, posso dizer que é de fato uma ceia, não a última, mas uma ceia que anceia poder alimentar um pouco mais o tão necessitado espírito humano.

Assis Costa, 12 de julho de 2014.

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1º Lugar na Categoria pintura
IV Salão de Artes Chico Santeiro 2014

Divulgado resultado do IV Salão de Artes Chico Santeiro - See more at: http://www.cultura.rn.gov.br/Conteudo.asp?TRAN=ITEM&TARG=37204&ACT=&PAGE=&PARM=&LBL=NOT%CDCIA#sthash.m3hdkkXO.dpuf